domingo, 18 de julho de 2010

Insonhar



Aquele acordo silencioso possuía um mistério nada saboroso. Não explicaram as regras, não explicaram o jogo, mas eles viviam claramente daquele jeito, como se soubessem, como se esperassem, como se concordassem. Os corpos iam de um lado para o outro, em um mecanismo absurdamente valoroso. Apesar de toda a reza, apesar de todo o choro, apesar de toda a euforia, de toda a mentira, o mito, a palavra, mesmo com toda a vontade, o acordo eles cumpririam. Nem precisavam saber, pois assim mesmo sempre saberiam. Ao silêncio nunca resistiriam.

Vingaram as distrações, a dormência e as ilusões, eis o segredo dos corações, a dor latente de um ser sem paixões, de enfim, nada temer, pois esta insônia toda teria mesmo que ceder. Foi só alucinação, foi só impressão. Passa hora, passa tempo, passa agora.

Aos poucos, os tons vão baixando, os instrumentos parando, as vozes sumindo. Bem baixinho, isto tudo acontecendo. Sorrateiramente vencendo, mesmo anoitecendo, mesmo amanhecendo, adormecendo, adormecendo, adormecendo...


O relógio, o sonho, a vida, o engano. São olhos abertos, vermelhos, gana e vontade. Vigília e pulso, cochilo e coragem. Fantasma, zumbi, insônia, agonia. Não cansa, não cansa, não cansa de toda a lembrança, o branco, o escuro, o nada, o absurdo. Deito, leito, vibro, bailo, madrugo. Aceito, direito, é cedo, é isso, consigo, vencido, morto, o acordo, silêncio é talento, nem fecho, nem tanto, nem tento, é só o momento, não surpreendo, defunto, inundo, imundo, vou fundo, profundo, no fundo do mundo... Anda, corre e voa, que luz não magoa e vai à toa, silêncio ecoa, ecoa, ecoa, ecoa...



Nana nenem
que a cuca vem pegar
papai foi pra roça
mamãe foi trabalhar.
Nana nenem
que a cuca vem pegar
papai foi pra roça
mamãe foi trabalhar...